sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Ruela

Eu entrei por aqueles cantos
Me escondi com os teus servos
Das canelas são como pombos
São a ruela da tua morada

Embriaguei nas tuas calçadas
Um mundo de nostalgia
Eu dobrei as tuas esquinas
Esfomeado de alegria

Eu enterrei todos os ossos
Queimando ao sol de meio-dia
Numa caveira com farinha,
O que Bete Faria?

Eu pisarei nas lacraias compridas,
Eu pisarei na merda, porcaria!
Ao sair desta avenida
E andar pela ruela fedida.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Fogo

Prevenir a queimada das matas
Ou as queimaduras nas pessoas?
Queimaduras graves podem matar
E pessoas no mato podem queimar

Eis ali a padaria do Dirceu,
Aquele o qual a mata deixou
Com sua balconista que vendeu
A rosca que o padeiro não queimou.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Caminho das Pedras

Sobre meus pés caminho o caminho sob meus pés.
Pés existem. Caminhos existem. Pedras existem.
Há um pé no caminho enquando o outro levanta.
Há um caminho no pé que a mente nos adianta.
Pedra no caminho adiante.
Pedra no caminho passado.
Pedras procuram seus Pedros.
Meu nome não é Pedro.
Meu nome é Setora.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

As Pautas do Intestino

Nas entranhas do deserto
Mandei um papo esperto
Para o vendedor de pastel
Cinco por uma garrafa de mel.

Tuas hortas eu marquei
Por onde correndo passei
Com o lastro desastroso
Do intestino infeccioso.

Grande foi a correria
Por duas noites e um dia
Onde no deserto sem dinheiro
Tentei trocar mel por banheiro.

Estimo a minha melhora
Pois no estado de agora
Perdi todos os quilos nossos
Só sobrou a gordura dos ossos

E quando o deserto se fez ausente
Estava meu amigo na minha frente
Apelidado de Mestre Raposa Felpuda
E ele me deu a sua própria bermuda!

Fira

Descasquei as escamas da cor
E as lancei no saco da doçura
Quando encontrei-me escritor.

Quando descobri a palavra "amor"
E a escrevia, parecia tão pura
Eu era apenas um amante amador

Ingênuo e inexperiente homem
Um caçador desatento
Um papagaio sem vento
No abismo despenco
A mercê do impacto que me parará

E grandioso foi meu pecar
Não conseguia conquistar
Apenas me via estando a cobiçar
A glória dos outros para a roubar

O que diria o próprio anjo mau
Quando de mau com sua natureza?
Ou ao lado da armadura que despira
Gritaria meu nome para que eu o fira?

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Atchim

Era uma visão hormonal
Aquele almoço das sobras
Perfeita reunião sem igual
Dos que trabalham nas obras

Observo traças em meu feijão
Ao perceber alguém olhar, eu aceno
Peço pro pedreiro pequeno passar o manjericão

Não satisfeito, tusso obsceno
Pois meu espirro se torna veneno
Quando o catarro cai sobre o agrião

Primeiro os salgados, depois os doces
Uma laranja sem bagaço
Derramando-se sobre couves-flores
Ao lado dos grãos de arroz e seus alvores
Perante aqueles que serão seus engolidores.

Vendo

O elemento vendo
O tornozelo que acama
Em tropeço na lama
Do cego remelento

Eu já tenho há um tempo
E agora estou vendendo
Antes de se interditar

Duas lâminas divididas
Já foram de talho, corte
Amolei, vendi na esquina

Agora é tudo mais em cima
E já chegaram mais da China
De porcelana óssil suína
Para batina ou para rapina.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Calção

Calção dos meus bagos
Entre as coxas esmago-os.

Como bolas intocáveis
Coladas nos cartazes

Para conquistar
E multiplicar

As cuecas históricas
Ainda vão se aposentar

Como prosas escondidas
Em folhas vergonhosas

Pintando as valas
Feios peixes nas águas

Tão mal bordadas
Tão bem guardadas

A festa das linhas
Estava alargada.

Aperto

Mendiga, para que tu saibas,
Meu uniforme é de esquilo que nada,

Os frutos que tu colhias
E com sorriso comias,

Entalaram na digestão
Como a flor da torta de limão.

Com o formato do bico da poma
Da tua superstição

Que parece o condiloma
da bruxa da história de Maria e João

São os líricos da percussão
Tocando nas fossas em construção

Perto dos meus dedos,
Perto das minhas rodas,

Tu lembra do uredo
Tu lembra da nódoa

Tu me mira e arrota
Dentro da sua própria moda.

Poesia Lenta - Previsto

Luz negra que desacende
Em dia de sol tão quente

Corrida amouca,
Pelado sem touca
Com a garganta rouca.

E há reencontro no amanhecer
Entre os que acabam de renascer

O teu riso odiado
Leva embora um veado assado.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Vamos Sair

Vamos sair das poesias por um momento
E contemplar a complexidade do nada.
Vamos sair das rimas de amor e lamento
E rirmos dos nossos tropeços na calçada.

Vamos sair da rotina e pular uma linha

Vamos sair e mudar o assunto,
Já ouviu a Rádio Polska Stacja?
Vamos sair do computador,
Não que estejamos nele...

Mas não importa!

Vamos sair a imitar Silvio Santos,
Arrotar, beber mate, jogar dominó.
Vamos sair para o sítio da minha vó?

terça-feira, 13 de abril de 2010

Fotos de Flores

Tirando fotos de flores,
Vi que foram desenhadas
Com alguns lápis de cores
Sobre linhas canetadas

Tiradas duma apostila
Cópia da original
Emprestada da Camila
Com montagem de jornal

Ainda assim me parece
Um pouco com a verdadeira
Que aos poucos envelhece
Sem o amor da jardineira

Mas no cartão de memória
Esta foto digital
Sobrevive na história
Por mais tempo que a real

Mesmo só sendo um desenho
Da cópia da ilustração,
Ao olhar pra ele eu tenho
Uma flor na imensidão.

domingo, 4 de abril de 2010

Neo-Eficiência

A grande força dos braços
Consegue mover a mesa
Mas as cadeiras é que encantam
E caem nas graças das moças

Olhares cativos e penetrantes,
Com ar sério por trás das lentes.
Ainda assim não convencem
Mais que as curvas das pernas

Num piscar de olhos descobre
A resposta de sua pergunta
Não satisfeito torna a indagar

Percebe desiludido no espelho
Que seu reflexo é mais importante
Do que tudo que tem a mostrar.

Sua vida, vontade, esforço
Nada importa só a matéria
Que criou em si um ser exótico

A inútil luta travada
Sempre esteve perdida
Pois o fruto do seu sucesso
Foi gerado pelo capital erótico

segunda-feira, 1 de março de 2010

O Novo

Agora que o novo chegou
O antigo para trás ficou
E uma nova doutrina começou
O Neo-Matereísmo. Uou!

Mas um novo rótulo não o torna novo
Pois se o velho continua, é estorvo
Assim como o pinto escondido no ovo
Não é mais tão fácil enganar o povo

Não será desfeito o passado nosso
Para que saiba o quanto eu esboço
Eu nada escrevo daquilo que posso
Tudo será para conhecimento vosso

Das rimas que estou enferrujado
Das lamas em que estive atolado
Das águas em que estive afogado
Das milhas que ficaria afastado

Ninguém mais me verá caído
Eis que ressurgirei polido
Para recitar a todo ouvido
É Deus em quem tenho crido

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

001 - A Queda de Sitanel

Dono do rastro branco no céu
que voava entre nuvens de algodão
rasgando como flecha seu véu
ao avançar veloz como um gavião

Com suas asas a luz do sol cobria.
Quando queríamos, dava-nos sombra
e ao seu vôo rasante, tufões fazia
para espantar tudo que nos assombra.

Por muito, sempre nos quis proteger
do mal e dos maus, da liberdade, não!
Mas seu poder não o impediu de descer,
forçado por Deus, como nós, ao chão.

Sentiu o prazer privado enquanto anjo
no cheiro das flores, no sabor do mel,
na fanfarra com flauta, tambor e banjo.
Perguntei-o "Agora és humano, Sitanel?"

E ele respondeu-me silenciosamente
com seu olhar triste, vazio e calado
que não era humano completamente,
pois nunca estivera apaixonado.

Vivendo conosco aprendeu e ensinou
tentando agir como alguém normal.
Mostrou que seu corpo desimortalizou,
mas seu espírito, como o nosso, é imortal.

Já havia feito mais que nos defender
quando nos capacitou para enfrentar
os desafios que venham a aparecer
e as tragédias que não podemos evitar.

Faltava apenas trabalhar o Cupido,
porque de todas setas nele lançadas
nenhuma teve seu coração atingido,
só pernas e nádegas foram acertadas.