domingo, 28 de janeiro de 2007

O Tempo

Hoje o tempo está o que estava amanhã.
Anjo na areia da praia, mal desenhado,
perto de onde ontem eu estava sentado
com minha mãe, meu pai e minha irmã.

Umas nuvens levadas nos céus pelo vento
é tudo que posso ver pela pequena fresta,
mesmo próximo, encostando até a testa
e olhando pelo olho menos remelento.

Manhã de prelúdio de um novo começo
de mais um dia que ainda vai se passar.
Se pelo menos eu parasse as ondas do mar...
Talvez conseguisse se voltasse do berço.

Abro a porta, vou em direção ao oceano.
Ao que me acaricia suave no peito a brisa,
aproximo do mar como o carro da balisa.
Sinto água nos meus pés, me rodeando.

Quanto tempo dura a rocha mais dura?
Para onde foram o anjo e as pegadas?
Se minhas obras foram bem apagadas,
então por que a água não me perfura?

sexta-feira, 26 de janeiro de 2007

Sobrevivente

Grande leva de pecadores,
não passam de fajutos atores
que de obsessão pelos seus amores
sofrem na vida, incastos de horrores.

Sobreviverei ao terremoto,
às grandes ondas do maremoto,
ao apressado entregador de moto
e até mesmo aos carros que capoto...

Mas sem você, eu morrerei.
Por você, certamente pecarei.
Pela sua alma e felicidade lutarei.
Da minha vida, agora, o que faço, não sei...

quinta-feira, 25 de janeiro de 2007

Apaguem os Versos de Mim

Apaguem os versos de mim,
essas palavras não falam!
Obra dos dias que passaram
cuja chatice não tinha fim.

Nós ouvimos passos da morte.
Relógio de parede taqueando
e versos no teclado, teclando.
Apostaria se tivesse a sorte?

Posso por momentos esquecer
ao lembrar dos olhos, a olhar.
E ela está em seu melhor estar
que meus olhos poderiam ver.

Toda aleatoriedade criada
se transforma em inspiração.
Nascem-me versos que serão
cortantes como espada afiada.

Espada que encravo no peito.
Quanto mais nela eu penso,
mais aumenta o saldo tenso
por pensar em não ser o eleito.

Da gratidão com ódio e amor,
pelas cotas da minha existência
com alusão à sua experiência.
Atenda ao meu pedido, por favor.

Apaguem os versos de mim,
essas palavras eu não falei!
São desejos que não queimei
com ardente chama carmesim.

terça-feira, 23 de janeiro de 2007

Derrota

Hoje o vento sopra,
as folhas balançam,
os frutos se lançam
e a árvore dobra.

No céu uma nuvem,
na terra, há outras
de poeiras soltas,
com cor de ferrugem.

Ela em sua cabana
põe cartas na mesa
a par de sua beleza
de origem africana.

A sorte salvadora
e sua habilidade
fazem-na celebridade
enquanto jogadora.

Do rei de espadas
à de copas rainha
afinidade mantinha.
Cartas embaralhadas.

Com valete de paus
e com um ás de ouro
fez-se o seu tesouro
ganhando dos maus.

Começou a andar torta.
Amparou-lhe o curinga.
Com uma garrafa de pinga
guiou-a até a sua porta.

E em sua cabana de pau
a espada fere-a no coração.
Fugindo com ouro na mão
o curinga não deixou sinal.

sábado, 20 de janeiro de 2007

Fel

Sombras delineadoras da paz
a que procuro,
por trás do mar escuro, que adorna
o teu manto pecador.

Simbolo do vínculo maldito , martelo esquecido ,
quando a ponta da faca estava a circular
no corpo estarrecido ,

Lar das ébrias histórias que contei
para adormercer , no espaço em terra que
abri para conhecer.

levanto meus olhos ao céu ,
nublado , como a névoa que cintila ,
que passeia nas ambiguidades de cada vida,

apodrecida , escarnecida , esquecida,

numa mistura , em um tonel de fel ,
perdida em um bar , em algum lugar.

Ambigüidade

Quando nos amamos, nos buscamos.
Quando nos achamos, nos perdemos,
e nos dividimos em outros ramos
de buscas e amores mais amenos.

Quando nos perdemos, nós ganhamos.
Quando ganhamos, nos desprezamos,
e o desprezo que nos damos há anos
é invisível por sagrados e profanos.

Quanto mais queremos, mais odiamos.
Quanto mais odiamos, menos queremos.
Quando menos queremos, então amamos,
e amamos muito mais além do extremo.

quarta-feira, 17 de janeiro de 2007

Poema Genérico


é
tu
sim
você
você?
você é
você ia
você era
você saiu
você chora
você nasceu
você é gente
você é humano
você é culpado
você é o que vê
você é diferente
você está vivendo
você está morrendo
você é o que nasceu
você é o que não sou
você era o que nasceu
você é quem eu não fui
você é o que envelheceu
você foi o que construiu
você quis ser o que não é
você gastou as suas forças
você arrependeu-se pelo não
você trabalhou o seu passado
você é o que seus pais querem
você perdeu as suas esperanças
você é o que a sociedade espera
você ganhou um pedaço do paraíso
você muito pouco agora pode fazer
você viveu sua vida humana como eu
você então aprendeu a morrer em paz
você foi exatamente o que é ser você
você veio ficou viveu depois se foi
debaixo da terra você desaparecerá
em nossas memórias você permanece
enquanto que um de você lembrará
por outro lado um outro esquece
mesmo sem vida tudo continuará
a cada dia descansando em paz
o que era matéria se desfará
para que outro venha e viva
e que o outro venha e leia
e descubra a sua história
enquanto as letras duram
ou seus olhos enxerguem
vem olhar o seu futuro
e você permanecerá aí
que leia antes de ir
não saia sem sorrir
só me deixe dormir
e me deixe sonhar
presente passado
vamos despertar
estou atrasado
te acompanhei
mas você foi
não esperou
não voltou
não olhou
e seguiu
não viu
nem eu
ou tu
eles
nós
eu
?

segunda-feira, 15 de janeiro de 2007

O Paladino

Nossa origem é a mesma, mas tu me feres.
Nosso destino é o mesmo, queres antecipação.
És obra do ódio, feita para cortar sem ver a quem.
Sou fruto do amor, feito para aquecer o coração.
Seria fruto do amor quem te empunha também?

És fria e sequiosa de meu sangue quente e vermelho,
e teu fio é a saída da chama negra da alma humana.
Sou quem tu cortas, por ser quem te sustenta e guia.
Brilhas em cada centímetro de existência profana,
E teu fim será na ferrugem pela minha sangria.

E derrotados por nossas próprias conquistas,
quando ambos deitarmos neste solo amargo,
voltaremos à origem, que é nosso destino,
para levantarmos de mais um breve letargo
para que eu seja a espada, e tu, o paladino.

sexta-feira, 12 de janeiro de 2007

A existência

A fantasia extravasando alegria,
Loucuras dos sonhos dançantes,
Que transbordam sua magia,
E nos carregam delirantes.

No outro canto, emburrada,
A sensata estupidez humana,
Que sempre nos leva ao nada,
Enquanto almejamos a fama.

O erro na certeza sem dúvida.
A dúvida se a certeza é um erro.
Perguntar faz parte da vida,
mas o que é a vida, mesmo?

O existir é um problema,
Ou a falha está em ser?
A morte destrói a existência,
Ou ela destrói você?

segunda-feira, 8 de janeiro de 2007

A Travessia

Vultos que voam nos ventos da vagueza,
sois obra de minha mente ou da natureza?
Sombras que vão no vão da escuridão,
sois produtos da noite ou da solidão?


Caixas empilhadas em poeira no canto,
contendes mais armas para o povo santo?
Homem sentados em belas cadeiras,
transformareis os soldados em caveiras?

As pessoas que me esperarem no paraíso
esperarão-me até o dia do último juízo?
Os versos que me deram esta glória
Sumirão sem entrarem para a história?

E, de que outras maneiras eu poderia
transformar minha alegria em poesia?
Todas minhas paixões numa só orgia?
Minha longa jornada em curta travessia?

sexta-feira, 5 de janeiro de 2007

A morte

Seus olhos enxergam
O que a ti é invisível
Suas garras dilaceram
Até mesmo o intangível

Ninguém foge à sua verdade
Nada vai contra sua fúria
E se ouves a lamúria
Diminui-se a piedade

O fim é o que ela prega
amiga e inimiga da justiça
e tão cega quanto ela

Sai a qualquer hora ou dia
Do abismo que se esconde
Buscando nova companhia

quinta-feira, 4 de janeiro de 2007

Lobos Uivantes

Céu de lua de cheia tigela prateada,
cercada de estrelas de pontas de lança.
Folhas de bambu que o vento balança
e as lança às poças d'água na estrada.

Sons de dedilhadas cordas da harpa
não são calmos para poder pernoitar,
nem são desafinados para te acordar
do sono que dorme na verde escarpa.

Calmo tempo que devagar passará,
com calma, lento, detalhado e certo.
Observo que tudo dorme por perto,
e escrevo os versos abaixo, você lerá.

Ao passo que ouço um intruso na casa,
corro silencioso pelas moitas de capim,
desembainho minha espada espadachim
para fatiar essa ousada pessoa rasa.

Surpresos, dois lobos com um pernil,
sairam corrento, com meu jantar preparado.
Fico somente com a certeza do resultado:
quem come pernil é a cadela que os pariu.

quarta-feira, 3 de janeiro de 2007

Chuva

Chuva d'água virgem celestial,
nostalgia cadente colore sem cor
meu rosto nesta hora matinal
que tanto preciso de seu amor.

Finas agulhas geladas na pele,
como o despertar para caminhar
que, por mais forte que eu apele
ou congele, não me deixa adiar.

Nuvens de cores negra e branca
cobrem o sol, nos roubam a luz,
e, enquanto o vento as espanca
desenhos e formas nelas produz.

E aí vem a chuva novamente,
no sopro dos ventos da mudança
em uma noite de vapor ardente,
branda como inocente criança.

Triste prelúdio do fim amargo
dos círculos de areia que fizemos
dum momento nosso de letargo
onde estiada a chuva, corremos.

Abismo

Abismo abstrato da concretude,
existe onde nada há ou exista.
Há coisa que é mais matereísta?
O que faço para que te mude?

Mais que a linha do horizonte,
é a existência numa desistência.
Como descrever tua aparência
se vejo que olhas minha fronte?

És algo mais além de um portal
onde os pilares do céu têm base
no mundo de humanidade mortal?

És o marco do fim de uma fase
cujo próximo passo será o final,
ou só um substantivo, numa frase?

terça-feira, 2 de janeiro de 2007

Perfeição

Querendo alcançar o palpável no infinito,
Vazo por entre a brecha sob a porta
A perfeição seria a minha toca,
Se capaz de desvendar o seu caminho.

A loucura me consome cada parte,
Afugento-me em qualquer canto,
Afogando os olhos nesse pranto,
Digo adeus à sanidade.

Onde se encontra esta virgem,
A quem devoto minha vida,
E vagando em seu manto escondida,
Sem deixar qualquer vestígio?

Se não te vejo, sou cego.
Se não a possuo, miserável.
Condenado, pois sempre quero,
O que é de fato inalcançável.

A resposta já existe, é secular.
O que não há é a pergunta.
Eu quero o ar sem respirar
A vitória e não a luta.

Cobro-me sempre o mesmo,
Não aceito sua falta,
Insulto o reflexo no espelho,
Enfureço-me, sinto raiva.

Assim mesmo sigo andando,
Vivendo no erro, sendo normal.
Nas próprias pernas tropeçando,
Confuso, como um animal.

Criatura

Abrace-me, segure-me agora!
Enquanto nosso sangue corre,
é a hora que o tempo escorre.
Corra! Agora será nossa hora!

Jogue comigo só mais um jogo,
Ganhando, perdendo ou empatando,
vamos juntos o tempo gozando,
juntando e soldando com fogo.

Fogo que arde e queima, fere,
mas o calor que sinto, cura,
portando, não se desespere.

Junte a mim a tua cintura.
E depois que o tempo zere,
seremos mais uma criatura.

Silêncio

Silêncio extinto. Ouvidos famintos.
Falar o quê? Música no karaokê.
Não pressinto. Apertem os cintos.
Sem balê, só me alegraria você.

Mas ao sumir toda essa beleza,
pomos a culpa na velocidade.
Não ouvimos os sons da natureza,
nem há mais silêncio nessa cidade.

Grite e corra, corra na correria!
Sebo nas canelas e você some.
Corra e grite, grite na gritaria!
Tão grande boca! Morcego come.

Não encontra-se mais paz aqui,
seus pensamentos ainda falam.
Escandaloso vendedor de caqui,
tenta empurrar os que sobraram!

Risos e gargalhadas, choro só.
Nostálgica madrugada amarelada.
Palavras cruzadas te dão nó,
és mais uma pessoa silenciada.

Definição Prática

O Matereísmo é o movimento literário que busca a ruptura com o pós-modernismo através da não-ruptura, rompendo assim com todos os movimentos anteriores. Vem da consideração da matéria, do etéreo e do abismo paradoxal do definitivismo aleatório circular.

Combina-se o seguinte:

Materialismo:
O materialismo designa um conjunto de doutrinas filosóficas que, ao rejeitar a existência de um princípio espiritual liga toda a realidade à matéria e a suas modificações.

Etereísmo:
A consciência da existência do Mundo das Idéias, como um idealismo, a força invisível que não só explica os fenômenos que a ciência não explica, como também os que ela explica.

Abismo paradoxal:
A existência na não-existência, um abismo é o nada, e o nada é um abismo. Mas se é, é algo, e sendo algo não pode ser nada. Não é um todo mas também não lhe faltam partes.

Definitivismo aleatório circular:
É o dom de desconhecer a fundamentação originária de algo, além de buscar o desequilíbrio nas interdependências, como a sombra, a luz e a coisa iluminada. Objetos originam-se em idéias, mas idéias vêm de onde?